28 de março de 2014

Por toda uma vida



Em época de guerra, um jovem se despede de sua amada, após a convocação do serviço militar. Havia pouco tempo juntos, mas o bastante para criarem um laço profundo. Tristes pela forçosa separação e pelo destino incerto, eles não se prometeram nada, apenas cartas.


Ele partiu sem saber seu futuro, enquanto ela lamentava aquele súbito desfecho de um romance promissor. Os anos se passaram, as cartas foram se tornando cada vez mais raras, e um novo pretendente apareceu no meio do caminho. Só restavam as boas lembranças daquele que talvez fosse seu verdadeiro amor.


Mas o destino tem lá suas belas surpresas. Com o fim da guerra, as tropas retornaram às suas origens, trazendo seus heróis, entre feridos, mutilados e sobreviventes. Dentre tantos, lá estava aquele rapaz apaixonado, que deixou uma vida pendente, um amor incubado. E sua força em retomar aquela história inacabada era tão forte, que não importavam as páginas escritas por terceiros durante sua ausência. Ele voltou disposto a retornar do ponto que parou.


Ao descobrir do novo romance de sua amada, com a mesma bravura e persistência que lutou nos difíceis anos de guerra, ele decidiu brigar por ela. Ah! O amor... não há tempo e distância que o separem de verdade. Eles se reencontraram, é claro, e aquilo que já estava previsto, só confirmou com matrimônio.


E Deus, com sua benevolência infinita, lhes permitiu uma vida a dois digna dos grandes romances. Em novembro de 2013, eles completaram 66 anos de casados.


Recentemente, um dos casais mais emblemáticos da televisão brasileira – Paulo Goulart e Nicette Bruno – comoveu a todos com a partida do ator, que desencarnou após longo período doente. Depois de 60 anos de casados, comemorados durante a internação dele, nem a morte trouxe a separação do casal. Como Nicette afirmou na ocasião, trata-se de uma breve separação, porque o amor é eterno e a certeza de que um dia estarão juntos novamente é a mesma de que somos imortais.


Diante de exemplos como esses, questiono como nossa geração enxerga o verdadeiro valor do casamento, de um relacionamento em geral. Vejo alguns casais descrentes de uma vida longa a dois, incapazes de superar crises conjugais e dificuldades comuns da vida moderna. É claro que, para existir um casamento maduro, é preciso renúncia, mais acima de tudo respeito e companheirismo. A vontade de um não pode sempre prevalecer a do outro. Não existem regras, somos sujeitos ao erro, mas saber reconhecer suas falhas e buscar o equilíbrio é sempre o melhor caminho. Aprendemos com os erros nossos e alheios. Aprendemos a ouvir mais que falar. Aprendemos a reconhecer a renúncia do próximo, ou pelo menos deveríamos prestar mais atenção. 


Por outro lado, vejo pessoas que buscam incessantemente por um amor perfeito, quando sabemos que não há perfeição. Muitas vezes, por depositar nossa felicidade no próximo, nos decepcionamos, frustramos nossas inúmeras expectativas quando não “encontramos a pessoa certa”. A velha ansiedade nos cega para o que está ao nosso lado. Desejamos o impossível, o inviável, o inexistente. Vivemos a vida alheia, daqueles que “deram certo”, acompanhando a felicidade superficial estampada nas redes sociais. Estou para ver alguém postar uma foto de separação com a legenda “já vai tarde”!


Acredito no destino, no amor duradouro, no casamento maduro e feliz, como os exemplos descritos lá em cima. Eles superaram a dor da separação, seja por uma guerra, seja pela dor da morte, mas nem por isso esqueceram o verdadeiro significado do casamento. Amor para toda vida, com todos seus dilemas, suas dúvidas, seus dramas, distâncias, brigas, desencontros, mas, sobretudo, amor eterno.

19 de março de 2014

Auto-conhecimento



Este ano retornei ao grupo de estudo da doutrina espírita. Algo que me fazia falta porque, além de estudar e aprender mais sobre a doutrina que escolhi, é uma oportunidade que tenho a cada semana de refletir sobre minhas ações (ou falta delas) e de auto-análise.

Ser espírita não é apenas crer na vida após a morte, acreditar na reencarnação e crer nos ensinamentos de Jesus. É assumir um compromisso consigo mesmo e com a espiritualidade, na busca de seu progresso espiritual através da prática da caridade. Passamos a ter consciência da nossa missão enquanto encarnados, ou pelo menos, acreditamos que há um planejamento prévio, estabelecido antes de reencarnarmos. Portanto, sabemos que houve um comprometimento de nossa parte em cumprir tal planejamento.

Quando encarnamos, esquecemos propositalmente tudo aquilo que foi planejado no plano espiritual. Digo propositalmente porque se nós, espíritos em evolução, tivéssemos consciência plena de todas nossas falhas pretéritas, viveríamos perturbados diante de tantas cobranças íntimas. Não sabemos o que exatamente cometemos em vidas passadas, mas se estamos encarnados certamente é porque temos uma missão, algo a ser reparado, provas e expiações a serem cumpridas. Nossa nova oportunidade de vida é como um papel em branco, em que vamos aos poucos preenchendo com boas ou más atitudes e pensamentos. Assim como na escola, onde sabemos que o erro faz parte do aprendizado; em nossa vida nem sempre escolhemos os melhores caminhos, as melhores respostas, as melhores condutas. Mas nem por isso, deixamos de reconhecer o erro (quando percebemos a tempo) e tentamos consertar, ou melhorar.

Vejo no espiritismo uma verdadeira escola da vida, onde somos encaminhados aos ensinamentos de Jesus – a verdade e o caminho. É buscar as respostas para os desafios que encontramos no dia a dia. Crer que para tudo há um sentido, um significado, nada é por acaso e que as provas e expiações nos servem para amadurecer, aprender e evoluir.

É um momento de auto-conhecimento, identificando nossas falhas, nossas fraquezas, medos, inseguranças. A auto-evangelização também é importante, quando assimilamos os ensinamentos e buscamos corrigir nossas falhas. Mas acima de tudo, percebemos o quanto estamos atrasados e precisamos evoluir, diante de exemplos de trabalhadores como Chico Xavier, Divaldo Franco, Irmã Sheila, Bezerra de Menezes, André Luiz e tantos que nos inspiram.

“Viver é uma arte, um ofício, só que precisa cuidado, pra perceber que olhar só pra dentro é o maior desperdício”. Portanto, essa auto-evangelização depende também de como estamos enxergando o nosso próximo. Amar o próximo como a si mesmo é essencial para nossa própria evolução. Doar-se é o compromisso que nós assumimos lá em cima, independente das nossas falhas. Nosso crescimento espiritual depende disso. O meu desejo (e vou tentar o máximo) é falar menos e praticar mais.

10 de março de 2014

Retrato da educação no “país de todos”



Fantástico exibiu no último domingo uma matéria especial mostrando a precária situação das escolas públicas no nordeste do país. A reportagem, que merece reconhecimento, faz uma denúncia de um problema crônico, bastante conhecido pela população desde sempre sobre um dos pilares de um país que se diz em desenvolvimento e avançado. Escolas sem o mínimo de condição estrutural para os alunos. Lugares abandonados, sem água potável, energia elétrica, instalações precárias, falta de merenda, esgoto aberto, material escasso ou danificado. Professores que tentam salvar uma rede pública de educação em estado vegetativo.

Fui aluno, durante toda minha vida escolar, de colégio público estadual e depois federal. Tive a oportunidade de estudar em uma escola de excelência, reconhecida internacionalmente como uma das melhores escolas públicas. Passei por sérios períodos de greve de funcionários, falta de professores concursados e, às vezes, situações precárias de infraestrutura, como banheiros depredados, carteiras e ventiladores danificados etc. Porém, tais dificuldades são ínfimas e insignificantes diante de uma realidade decadente e triste dessas escolas municipais encontradas principalmente em regiões rurais ou distantes das capitais.

A minha realidade era outra e, por isso mesmo, muitas vezes questionada por profissionais de ensino que acusavam de sistema elitizado, porque era voltado para poucos. De fato, se considerarmos o número de alunos matriculados em escolas públicas no Estado do Rio de Janeiro, a porcentagem atribuída aos alunos de escolas federais é muito pequena diante da realidade. São poucos os que têm a oportunidade de frequentar bibliotecas, laboratórios de ciência e de informática, quadras de esporte, além de salas climatizadas etc. São poucos alunos que têm em seu currículo escolar matérias como latim, inglês, francês, espanhol, educação para cidadania, filosofia, música, desenho, artes, sociologia. São poucos alunos que têm aula com professores mestres e doutores, com plano de carreira, direto à licença remunerada para estudos acadêmicos.

Mas quem está errado? A escola pública de qualidade que proporciona aos seus alunos uma educação completa, capaz de formar cidadãos conscientes, formadores de opinião, capacitados para enfrentar o mercado de trabalho de forma qualificada e ingressar nas universidades públicas? Não. Infelizmente, o que deveria ser padrão, torna-se alvo de críticas porque são apenas modelos de um sistema que deveria ser igual para todos que necessitam.

Qual a diferença de um aluno da região sudeste para um aluno do nordeste, norte ou outra região do país? Absolutamente nenhuma. As escolas federais são restritas às grandes metrópoles e, sim, recebem mais verbas e, portanto, mais estrutura que demais escolas da rede pública. As estaduais e municipais são precárias porque faltam verbas, mas também porque o controle por parte dos governantes é muito menor, diante da realidade brasileira.

No interior do Brasil, o voto de cabresto ainda é uma realidade. O velho coronelismo impede a verdadeira democracia. E daí, o dinheiro público não tem destino certo para escolas, hospitais. Fora isso, os professores não recebem o reconhecimento necessário, não só financeiro, como incentivo para pesquisa e pós-graduação.

O sentimento é de revolta e profunda tristeza, porque sabemos o quanto o país perde com esse atraso e essa imensa desigualdade. A cobrança deve existir sempre e a consciência do voto principalmente. Difícil é saber que falta muito para verdadeira transformação na cabeça dos próprios cidadãos sobre a importância do voto. Cobrar apenas não basta.