1 de fevereiro de 2010

FÉvereiro (Conto)

Parte 1
Parte 2

Um dia ela chega. Eu tenho certeza. Não vejo a hora desse dia chegar. Acordo todos os dias pensando nisso. Eu como, corro, viajo, trabalho, durmo e acordo pensando nela. Ainda que eu não saiba quem é exatamente, eu sei que ela existe. Eu sei.

Em um dia perdido de verão, naquele calor quase insuportável de 39 graus, com sensação térmica de 42, eu resolvi partir para bem longe. Peguei uma lancha emprestada com um amigo rico e resolvi me arriscar no mar. Um louco, eu sei. Mas precisava fugir daquele calor infernal do Rio. A minha loucura permitiu chegar até Arraial, quando por um milésimo de segundo imaginei que poderia estar cometendo de fato uma loucura. E se eu passasse mal? E se a pouca comida e bebida acabassem? E se o combustível da lancha chegasse ao fim? Pronto, seria o meu fim! Caramba! Estava eu perdendo totalmente o controle da minha vida... da nossa vida!


Então, desembarquei por ali mesmo. A praia era quase deserta, se não fossem uns poucos pescadores e outros morados de um pequeno vilarejo. Precisava tomar um banho decente. Uma boa ducha daquela de doer as costas. Precisava também comer algo que entupisse meu estômago. Não aguentava mais comer sardinha em lata, milho, palmito e azeitona. Tudo enlatado me enjoava, mais do que qualquer balanço do barco.

Logo que desci encontrei uma pequena pousada bem estilosa. Não tinha muito dinheiro no bolso, mas o suficiente para dormir por uma noite. Dava pra pagar pelo menos uma boa cochilada naquela bela pousada de frente para a praia. Dali, conseguia vigiar minha lancha. Minha não, do meu amigo rico... e louco. Não sei como ele me emprestou. Ou será que eu peguei sem avisá-lo? Confesso que não lembro. Estava bêbado.

Você parecia tão nítida naquela noite. Alta, cabelos longos, soltos, lisos... parecia feliz, com um corpo nem muito malhado, mas nem fora de forma. Do jeito que nós gostávamos. Você vinha sorrindo em minha direção com uma taça na mão. Seu quadril rebolava a cada passo que dava para frente em minha direção. Seus seios, lindos, fartos, acompanhavam o movimento em slow motion, praticamente. E quando parecia que você estava disposta a me pegar... eu acordei. Assustado com o barulho ensurdecedor de uma moto perto da pousada. Era um sonho. Você definitivamente não era real. Ainda não.

Perdi a hora, vi o sol já pronto do lado de fora da varanda. Já tinha passado o horário do café da manhã. Eu precisava voltar pro Rio. Liguei pro meu amigo rico. Falei que voltaria pro Rio de táxi e pedi para alguém vir buscar a lancha. E assim que cheguei ao Rio, lembrei porque saí correndo pro mar. O calor ainda era sufocante. 38,5 marcavam perto do Maracanã, quando passei de táxi.

Mais um convite para trabalhar em Nova Iorque. Mais uma vez tive que recusar. Eu sei que só lá estaria livre do calor do Rio. Mas eu só pensava em você. Não adianta. Não vou perder a oportunidade de lhe conhecer. E se eu fosse para fora agora, eu iria perder mais essa chance. Chega. Não quero mais perder chance nenhuma. A partir de agora você virou minha obsessão. Não penso em outra coisa que não seja lhe conhecer.

Esta noite vai rolar um get together na cobertura do meu amigo rico. O de sempre: mulheres lindas, peitudas e vazias. Não são como você. Daí eu chego lá, tomo várias taças e acabo na cama, com não sei lá quantas... Chega. Cansei dessa vida de hipócritas! Corpos sarados, mentes vazias. Sexo fácil e com prazo de validade vencida!

Mas cadê você? Onde lhe encontrar? Até quando você vai me burlar com suas viagens mirabolantes? Seus distúrbios mentais estão me enlouquecendo. Só lhe vejo atrás dos espelhos... nos retrovisores do carro...
Se eu fosse você, eu mudava de ideia logo. Parava com esse jogo de gato e rato. Me pegava logo, me jogava no chão, me arranhava, me lambia, me chupava...

Eu vou ter que fazer terapia. E é por sua causa, sabia? Você está me obrigando a isso! Nunca precisei de um psicólogo para controlar minha vida. Eu sempre me cuidei muito bem. Mas agora já não sei mais quem eu sou. Perdi o controle de tudo.

A faxineira já me perguntou porque estou fumando cada vez mais. Não sei o que responder... “é a ansiedade, Maria! Maldita da ansiedade”. Não bastava fumar demais, parei de malhar... por sua causa também. Não tenho mais vontade de acordar às 6 da manhã para colocar o corpo em dia. Para quem? Quem sabe criando uma barriga as mulheres param de me dar mole e você finalmente aparece para mim?

Então é isso? Você acha que eu sou galinha, ando com qualquer uma e por isso não lhe mereço? Fala logo isso, que eu paro já! Aliás, eu já parei com essa vida há algum tempo e só você não percebeu isso...

Deixa eu lhe provar que eu sou outra pessoa! Dê-me essa chance!

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