(caso não goste do tema, apenas não leia, por favor)
Quando criança, por duas vezes, minha mãe me levou ao centro
espírita para realizar cirurgia espiritual por conta de dores de cabeça
constantes. Na visão infantil, tudo parecia estranho, pessoas vestidas de
branco, rezando em voz alta, ambiente mal iluminado e uma sensação de “o que
estou fazendo aqui?”.
Recentemente, passei novamente por essa experiência. A
diferença é que agora a sensação foi outra e extremamente emocionante. Passei
boa parte da minha adolescência e início da fase adulta estudando a doutrina
espírita. Frequentei alguns centros, grupos de estudos, li importantes livros e
pude aprender (e ainda aprendo) a importância dessa doutrina que tem como tripé
a filosofia, ciência e a religião. Isso me faz enxergar com outros olhos essa
experiência incrível da cirurgia espiritual e sua importância na vida dos
encarnados.
Em uma manhã de sábado, acordei cedo, tomei um café
reforçado, mas respeitando uma dieta sem gordura (apropriada para quem se
submete a uma cirurgia convencional), procurei vestir-me com roupas claras e
levei uma garrafa com água filtrada, que mais tarde seria fluidificada para
assim servir-me de medicamento pós-cirurgia. Ao chegar ao local, deparei com um
grande grupo de pessoas igualmente vestidas de branco, com suas respectivas
garrafas, umas acompanhadas por parentes.
Nesse templo, havia inúmeros trabalhadores voluntários,
todos vestindo uma espécie de uniforme branco, como um jaleco, semelhante aos
médicos e enfermeiros. Todos ali estavam para receber e atender os que
chegavam, orientando quais os procedimentos corretos. Ao meio dia em ponto,
todos os trabalhadores da casa espírita se reuniram no centro do auditório, formando
uma corrente. Um senhor, de voz grave e imponente, deu início ao que podíamos
chamar de preparação para os trabalhos de caridade.
O sábado era também um dia especial – 12 de outubro: dia de
Nossa Senhora Aparecida. Para a doutrina espírita, não há comemoração ou
qualquer tipo de devoção, como no catolicismo, mas certamente o espírito de
Maria, mãe de Jesus, é reconhecido com um espírito de luz, de grande força. As
orações iniciais lembraram o papel consolador e amável de Maria, convocando
suas graças aos trabalhos que seriam iniciados em alguns instantes. Outros
espíritos de luz, reconhecidos pelas suas inúmeras contribuições para o progresso
da humanidade, também foram invocados a participarem junto a suas falanges.
Músicas também banhavam o ambiente de boas vibrações, com as
vozes entoando e pedindo o auxílio desses espíritos trabalhadores para garantir
o amparo necessário e elevar os pensamentos em prol da caridade e do amor de
Cristo. Em uma das canções, a letra embalava: “quanta luz nesse ambiente,
descendo sobre nós, juntando em nossas mentes/ quanta luz, quanto assim em
prece, como a alma cresce aos olhos de Jesus/ quanta luz, hoje em oração, a voz
do Mestre fala aos nossos corações/ quanta luz descendo sobre nós”.
Diante da força das preces, das vozes entoadas, uma grande
vibração pairava no ar, emocionando a todos e preparando os nossos espíritos
para receber a graça da cura e da benevolência.
Conforme os nomes eram chamados, cada paciente caminhava em
direção a uma antessala, onde o passe mediúnico era feito de forma individual,
a fim de preparar o períspirito ao procedimento cirúrgico. E ao entrar na sala
especialmente ambientada para cirurgia, uma trabalhadora da casa confirma o meu
nome antes do procedimento.
Na sala, uma cama coberta com lençol branco, um ponto de luz
focado no leito. Em volta, vários trabalhadores da casa formavam uma linda
corrente de prece, enquanto a senhora, sentada à direita do leito, agradece a
presença do espírito que irá conduzir a cirurgia. Bebo um gole de água
fluidificada e mentalizo a região a ser tratada na cirurgia. O procedimento não
tem interferência física, ninguém “incorporado” toca em mim, nem sinto qualquer
manifestação mediúnica. Apenas uma prece é realizada durante o procedimento. Logo
em seguida, sou transferido para uma maca e levado a uma outra sala, como uma
enfermaria, para permanecer em repouso por cerca de dez minutos. O tempo para
recuperação parece pouco, mas sinto-me tranquilo e em todo tempo consciente do
que acontece ao meu redor.
Vale ressaltar que em nenhum momento indiquei verbalmente ou
por escrito qual região do corpo necessitaria de tratamento. A transmissão de
pensamento minha com os espíritos responsáveis pelo procedimento é o suficiente
para o entendimento e realização da cirurgia. Ali como eu, tantos outros
buscavam o conforto espiritual e a cura necessária, conscientes que o trabalho
de caridade ali prestado só tem valor se for da vontade de Deus e por
merecimento de cada paciente. Cabe a nós termos fé e acreditar na cura e no
trabalho benevolente da espiritualidade, assim como todos que estavam ali não
“perdendo” seu sábado com sua família, mas sim ganhando com a prestação da caridade
de forma livre e espontânea.
A cirurgia espiritual pode ser realizada de várias maneiras,
conforme o regulamento de cada congregação espírita. A responsabilidade é muito
grande e a seriedade na realização dessas cirurgias também, tanto de quem
realiza (os espíritos desencarnados), quanto os trabalhadores médiuns que
prestam o serviço. Todos são gratuitos e é extremamente proibido qualquer
pedido de ajuda financeira.
A cirurgia espiritual não substitui o tratamento
convencional. Muitas vezes, ela funciona como uma preparação para uma cirurgia
convencional. São inúmeros casos em que o paciente recebe a graça de ter a
doença curada antes mesmo de passar por procedimentos indicados pela medicina
tradicional. Assim como muitas vezes, os médicos se surpreendem com a cura
“inesperada” de seus pacientes, porque desconhecem os efeitos gerados pela
medicina espiritual.
Cabe a cada indivíduo acreditar ou não, confiar ou não.
Acredito que a cura, independente de religião ou crença, está na mente de cada
um de nós. Buscar a cura está em praticar o bem ao próximo, sem esperar nada em
troca, respeitar as diferenças e escolhas de cada indivíduo, amar o próximo sem
preconceitos, independe de cor, religião, classe social etc. Enxergar sempre o
lado bom das coisas, emitir pensamentos positivos, acreditar que todos são
iguais e que merecem a compaixão. Não alimentar rancor, ódio, raiva, muito
menos desprezar ou ignorar o próximo, principalmente quando este lhe falta com
respeito. Enfim, ser um apóstolo do bem e colocar em prática as lições que
Jesus nos deixou.
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