30 de abril de 2012

“Somos veneno e antídoto”, quando o branco se depara com o índio


Parece incrível pensar que, em pleno século XX, existiam terras brasileiras ainda desconhecidas pelos brancos e onde os índios eram soberanos. O filme Xingu, do diretor Cao Hamburger, resgatou uma história pouco conhecida pela grande maioria dos brasileiros sobre a criação do importante Parque Nacional do Xingu, responsável pela preservação da cultura indígena do nosso país. O mérito desse grande e fundamental feito é exclusivo de três irmãos: Orlando, Cláudio e Leonardo, os irmãos Villas-Bôas.

Na década de 1940, os três jovens decidiram se aventurar na Expedição Rocandor-Xingu, promovida pelo governo brasileiro, com intuito de desbravar e reconhecer (demarcar) as terras do centro-oeste até então desconhecidas. Os irmãos se passaram por peões analfabetos para se misturarem aos homens que se alistaram em busca de trabalho. Mas ao contrário desses, Villas-Bôas tinham formação e dinheiro, portanto, o objetivo daquela aventura era outro. O que eles vivenciaram proporcionou uma experiência que mudou a vida dos três e dos povos indígenas brasileiros.


A “Marcha para o Oeste” trouxe a descoberta de povos até então isolados e, portanto, sem nenhum contato com a cultura branca. Sensíveis às causas indígenas e preocupados com o rumo da política nacional, os três irmãos, juntos, lutaram pela preservação da cultura indígena. Com muita articulação e importante influência aos poderosos da época, eles conseguiram estabelecer uma extensa área nativa para isolar os índios dos brancos. Essa era a única maneira que eles enxergavam para preservar os índios de forma efetiva. Cláudio, o irmão mais idealista, tinha consciência da ameaça do branco e afirmava: “Nós somos o antídoto e o veneno”.

Os brancos levavam o “progresso” ao mesmo tempo que transmitiam suas doenças. Muitos índios morreram pelo simples contato com o branco. E por isso, Claudio e seus irmãos lutavam para defender em todas as instâncias a causa indígena. Não só se estabeleceram nas tribos, como levaram médicos e enfermeiras para cuidarem dos doentes. Vacinaram os índios contra as doenças dos brancos.

Com a criação do Parque Nacional do Xingu, eles venceram uma batalha contra uma nação preconceituosa e indiferente. Na cena em que o irmão Orlando propõe o nome do que chamaria o novo parque, o ministro sem titubear afirma: “é melhor tirar  ´indígena´ de ´Parque Indígena do Xingu´, afinal, brasileiro não gosta de índios”.

Talvez a beleza desse filme está justamente em retratar por outra ótica a questão indígena no nosso país. Historicamente, não fomos educados para “aceitar” com naturalidade o espaço dos índios. Achamos que o progresso deve chegar para todos, inclusive para eles, mesmo sem saber se é isso que eles querem. A cultura dos brancos é invasiva, sempre foi. E o mais incrível é que o discurso “devemos respeitar a cultura dos índios” fica só na teoria. Quando o branco percebe o quanto está perdendo dinheiro com tanta terra produtiva mas inacessível, por conta dos índios, toda essa filosofia cai por terra, e todo mundo quer se dar bem. E foi exatamente isso que os irmãos Villas-Bôas lutaram a vida inteira. Lutaram contra os poderosos do governo, lutaram contra os militares e lutaram contra os empresários.

Cao Hamburger fez um filme extremamente sensível, sem piegas, sem sensacionalismo. Um filme que tem uma história bonita, com um final feliz, mas que sabemos que é parte de um todo. Todos os dias, assistimos nos noticiários a luta eterna dos índios por suas terras. O sensacionalismo do jornalismo diário ainda insiste em mostrar o índio como um “atrasado culturalmente”, um “anti-progressista”, um “invasor de terras alheias”. Portanto, a realidade

11 de abril de 2012

Paraty, Paratodos



Um lugar que respira história e revela surpresas naturais, assim é Paraty, a 245 km do Rio de Janeiro. Depois de conhecer Trindade, um pouco depois de Paraty, viajei para cidade histórica no feriado e desta vez pude conhecer alguns lugares fantásticos de lá.


Já havia passado por Paraty, mas nunca tinha ficado mais que um dia. E sempre me disseram: “o melhor de Paraty são as praias mais distantes”. De fato, quem visita a cidade, tem que fazer o passeio de barco pelas ilhas e praias desertas. O passeio dura cerca de cinco horas, com saídas do porto às 10h da manhã. A bordo da escuna “Príncipe dos mares”, conhecemos Ilha Comprida, Praia Saco da Velha, Lagoa Azul, Praia Vermelha. Em todas as paradas, o mergulho com snorkel é essencial, para quem gosta de mergulhar e ver as belezas marinhas, com grande variedade de peixes e corais. Em Ilha Comprida, a primeira parada, se o tempo estiver bom, com sol e céu claro, a água transparente facilita o mergulho. Mas vale lembrar que o tempo por lá é bem típico: durante o dia, um sol imponente, mas depois o tempo costuma mudar.

Assim como Trindade, Paraty também tem opções de ótimas cachoeiras, com piscinas naturais e trilhas fáceis e convidativas. Do outro lado da cidade, pegando a estrada em direção à Cunha, ficam o Poço da Pedra Comprida e a Cachoeira do Tobogã, como próprio nome já diz, é uma grande pedra lisa usada como escorregador terminando numa piscina natural.

Existem ainda as praias próximas ao centro, incluindo uma que passou a ser famosa pela lama acumulada no fundo. No carnaval, as pessoas se lambuzam com a tal lama e saem pelas ruas do centro histórico formando um bloco. Eu me aventurei andando no mar até não agüentar o volume de lama nas pernas. A sensação é bem estranha, porque o seu pé vai afundando no fundo do mar com uma lama viscosa. Infelizmente, no meio do caminho havia algo cortante (que não consegui identificar) que acabou cortando meu pé, mas isso faz parte de toda aventura...



Porém o passeio mais tradicional da cidade é de longe o centro histórico, com ruas e calçamentos com pedras irregulares – conhecidos como pé-de-moleque, construídos no século XVIII, graças ao comércio de ouro. As ruas se tornaram patrimônio histórico e por isso são conservadas, impedindo a entrada de veículos. A história está não só nas ruas mas também nas construções coloniais e nas igrejas – Igreja da Matriz (ou Nossa Senhora dos Remédios), Igreja da Santa Rita, Igreja de Nossa Senhora das Dores, e Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito.


Paraty é conhecida também como lugar da cachaça – recentemente oficializada a bebida genuinamente brasileira. Os alambiques são pontos de visitação também, com degustação das melhores cachaças do país. O Armazém da Cachaça, localizado no centro histórico, é uma boa opção de compras dessas especiarias.


Apesar de ser um lugar que vive praticamente do turismo, Paraty ainda tem estrutura de cidade pequena, principalmente em períodos de grande visitação, como férias e feriados. Em três dias por lá, faltou luz todos os dias, às vezes em curto período, outras mais prolongadas. Outro problema comum é o alagamento das ruas mais próximas do porto, quando a maré enche à tarde. Na volta do passeio de escuna, há uma surpresa um tanto desagradável para alguns turistas que depararam com seus carros imersos nas ruas alagadas. 



Mas de um modo geral, a cidade é bem receptiva, com ótimos restaurantes, preços justos e lugares super agradáveis para se conhecer. Percebe-se que grande parte dos turistas não é de brasileiros. Assim como Búzios, outra região praiana do estado que recebe milhares de turistas, Paraty está cheia de gringos encantados com a cultura da cachaça, do artesanato local, das praias paradisíacas e da arquitetura histórica.

10 de abril de 2012

Sobre Roberta Sá, “pra bom entendedor, meia palavra bas...”


Ela está lançando seu quinto álbum – Segunda Pele, mas parece que foi ontem que Roberta Sá começou sua carreira. De fato, foi ontem. A primeira aparição veio no programa Fama, em 2002, mas sua passagem foi esquecida, principalmente por ela. Na biografia em seu site, ela não cita essa participação, quando tinha apenas 21 anos.

Seu primeiro CD foi lançado dois anos depois, em 2004, já com sucesso “A Vizinha do Lado”, de Dorival Caymmi, como tema da novela “Celebridade”. No mesmo álbum, vieram: “Eu sambo mesmo” (Há quem sambe muito bem/ Há quem sambe por gostar/ Há quem sambe por ver os outros sambar), “Casa Pré fabricada” e “Ah, Se eu vou”.

Sua voz suave chama atenção, não só pelo bom repertório como também pela leveza e simplicidade no seu canto. Ela não faz esforço para cantar, muito menos grita (no estilo Ana Carolina). No início de carreira, alguns confundiam sua voz com Marisa Monte, justamente pela semelhança no modo suave de cantar.

Dessa nova geração de cantoras brasileiras, ela certamente se destaca. Já ouvi participação de Roberta Sá em diversas gravações importantes, desde homenagens a ícones de MPB (como Carmem Miranda), até parceria com Ney Matogrosso, MPB4 e Gilberto Gil para abertura de novela. Em seus últimos dois trabalhos, ela vai além do samba carioca, e mistura um pouco de tudo, de coco, maxixe, até maracatu, xote e samba-de-roda. Ela é eclética musicalmente e pode-se dizer que grande influência de suas escolhas profissionais tem a ver com seu parceiro e marido Pedro Luís.

Em “Segunda Pele”, Roberta Sá explora ainda mais os ritmos brasileiros, com arranjos que incluem, pela primeira vez, metais (trombone, trompete e sax), reunindo oito músicos no palco. E no show, Roberta Sá caprichou no figurino colorido, na simpatia e na energia empolgante.

Quando perguntei “qual artista da MPB você gostaria de homenagear em um possível álbum”, Roberta Sá deu dicas de Caetano Veloso, como compositor, mas também citou Elis, Gal e Maria Bethânia como intérpretes que merecem ser homenageadas. “Tenho uma vida para tantas homenagens”, promete a cantora aos seus fãs.

E para quem não entendeu o título, em seu show, Roberta canta “Ta?” de Mariana Aydar, que inicia com esse verso.

2 de abril de 2012

Seria um novo Frank Sinatra?


“Now you say you´re lonely/ You cried the whole night through/ Well, you can cry me a river/ Cry me a river/ I cried a river over you”…

Com essa letra tensa e um arranjo digno de trilha sonora épica, com uma orquestra alinhada, Michael Bublé abre seu espetáculo para arrastar uma multidão de aplausos, gritos e assovios, principalmente de mulheres.

Ele faz estilo Frank Sinatra, repaginado, com cara de século 21, mas com jeito de galã dos anos 40. Seu repertório é famoso pelo romantismo, pelas letras de dor de cotovelo e arranjos de jazz, blues e foxtrote, que trouxe uma nova cara para canções como Me and Mrs Jones e outros clássicos.

O show no Rio mostra um Michael Bublé muito além do seu terno impecável. Está despojado, brinca com a platéia, apresenta cada músico com uma piada e convida a todos para uma festa, não a um concerto, porque “concerto é chato”. Estão todos numa festa, livres para cantar, dançar, se divertir. E é nesse clima, que Michael imita seu xará, Michael Jackson, brincando de dançar e cantar como o rei do pop, invade a platéia, canta em cima de um palco improvisado nos fundos para ficar mais próximo do “povão”, chama duas meninas da platéia para tirar foto e muito mais.

Ao apresentar a banda, ele convida um brasileiro, guitarrista da banda, para falar em português algumas palavras de agradecimento. Em tom de brincadeira, o brasileiro diz que Michael não canta nada e ainda paga mal seus músicos. A platéia vem abaixo, bate palma e o próprio Michael acredita que todos estejam aplaudindo ele, sem entender nada de português.

No final, já com a cortina fechada, sem acompanhamento dos músicos, ele surpreende a todos cantando sem microfone para uma platéia de três mil pessoas. Inevitável não aplaudir de pé um cantor que vem mostrar seus múltiplos talentos e ainda faz graça de si mesmo.