24 de abril de 2014

Finalmente Ilha Grande


Sempre ouvir falar bem de Ilha Grande e, como carioca, me sentia frustrado por ainda não ter ido lá, depois de conhecer tantos lugares paradisíacos, como Fernando de Noronha, Jeri, Maragogi, Trindade etc. A verdade é que toda vez que um grupo de amigos marcava uma ida à ilha, era para acampar, algo que nunca fiz questão de fazer. Topo fazer trilhas, andar de barco, descobrir lugares de difícil acesso, mas dormir em acampamento não rola.


Vila de Abraão - centro de Ilha Grande
Nesse longo feriado de Páscoa, que juntou Tiradentes (feriado maior que o carnaval!), resolvemos reunir os amigos e finalmente conhecer a tão famosa ilha. Para começar, optamos acordar bem cedo para fugir de engarrafamento, o que foi perfeito. Assim que chegamos em Conceição de Jacareí (um pouco depois de Mangaratiba), conseguimos embarcar no primeiro horário de flex boat para ilha, o que realizamos em apenas quinze minutos (com emoção!).


Praia de Palmas - trilha de uma hora de Abraão
Já em Ilha Grande, deixamos as malas na pousada logo cedo e decidimos pegar a trilha da Vila de Abraão à praia de Lopes Mendes, considerada a segunda praia selvagem mais bonita do Brasil. Ok, não imaginávamos que encararíamos um longo caminho pela frente, afinal, no mapa de trilhas da Ilha, a “carinha sorrindo” indicava uma trilha nível fácil, sem grandes riscos. Mas para chegar até Lopes Mendes, foi necessário passar primeiro por outras praias, como Palmas e Pouso. E aí que percebemos a “pegadinha do Malandro”! Na verdade, a maioria das pessoas pega um barco de Abraão até a Praia de Pouso, onde tem uma pequena trilha de 20 minutos até Lopes Mendes (essa praia não dá acesso a barco). A nossa caminhada então resultou em 3 horas de trilha, com muitas subidas, descidas, pedras e um pouco de lama. Chegamos exaustos no destino final, mas com a sensação de superação. É claro que o visual compensa todo esforço, e não tinha uma parada que não apreciávamos a natureza e sua beleza preservada.


Praia de Lopes Mendes
Já no segundo dia, optamos por um passeio de barco por pontos já badalados da Ilha, como Lagoa Azul e Verde. Confesso que foi decepcionante o passeio, principalmente pelo número de barcos, lanchas e saveiros lotados que ocupavam grande parte dessas praias isoladas. Além de povoado, percebia a influência de tanta gente, com lixos espalhados no mar, o que infelizmente descaracterizava a imagem de “preservação ambiental” da ilha. Outro problema grave é a falta de respeito dos manobristas de lanchas, que faziam manobras arriscadas próximo das pessoas no mar, e não respeitavam as distâncias entre as lanchas e os saveiros. Deveria existir uma fiscalização principalmente em períodos de grande movimentação, como em feriados, para evitar qualquer tipo de acidente.

Lagoa Azul - concentração de barcos e lanchas no feriado



É lógico que é preferível visitar a ilha fora de feriados e período de férias, porque tudo é mais caro e lotado, mas se não há essa opção, o melhor é tentar fugir das aglomerações, como esses passeios de barco. Há praias praticamente desertas e próximas de Abraão, como Palmas e Abraãzinho, que já merecem a viagem. Nada se compara a qualquer praia do Rio, porque a tranquilidade do mar, praticamente sem onda, a faixa de areia, o verde em volta, enfim, tudo isso nos leva a sensação de isolamento total.



Superpopulação na Cachoeira da Feiticeira
Ilha Grande preza pela beleza natural, portanto, quem busca muito conforto e serviços de alto padrão, lá não é o melhor lugar. Assim como Fernando de Noronha, para conhecer bem a ilha tem que estar disposto a caminhar muito, se aventurar nas trilhas ou pelo menos não se importar em andar em barcos e taxi boat, que oferecem serviço de transporte para algumas praias mais conhecidas. A cachoeira da Feiticeira é uma opção para quem não gosta só de praia e tem uma trilha de uma hora de Abraão até lá. 


A Vila de Abraão é o único centro da ilha, mesmo assim parece uma cidade cenográfica, onde só se anda a pé e onde tudo acontece. E como a proposta é curtir a natureza, à noite a programação não é tão variada, com opções de bares e restaurantes descolados, uma concentração de gente perto da Igreja, onde rola uma música ao vivo e, para quem quer arriscar uma noite roots, um forró e reggae na praia de Palmas até as 6 da manhã. Lá também tem um lugar de nome esquisito – Espaço Ipaum Guaçu – onde rolam festas. Inclusive, finalizamos nossa viagem com uma festa à fantasia no domingo de Páscoa, com muita gente animada em todos os sentidos, rs.


Restaurante com decoração descolada no centro de Abraão
Mesmo em um feriado longo, fica difícil conhecer todas as praias da ilha. E sinceramente, não vale a pena passar o dia andando de lancha para tentar percorrer todos os principais pontos. Ficaram faltando dessa vez praia do Aventureiro, Caxadaço, Dois Rios, a gruta do Acaiá, Parnaioca etc. Para quem mora no Rio, ter um lugar paradisíaco como esse a duas horas da cidade, só aumenta a vontade de voltar mais vezes, principalmente longe dos feriados prolongados. 

Aqueduto de Lazareto no centro de Abraão

Informações sobre a Ilha, como chegar e opções de passeios: site Ilha Grande Portal

11 de abril de 2014

“O estranho caso do cachorro morto” – a peça

Divulgação
Como lidar com o autismo? O que passa na cabeça de um menino portador da síndrome? Quais os obstáculos de que ele e sua família enfrentam na sociedade? “Enquanto os outros educavam seus filhos para o mundo, eu tenho que educar o mundo para meu filho”, diz uma mãe de um menino autista.

Baseado em um livro de Mark Haddon, a peça narra uma história extraordinária na visão de um garoto não especial, mas igualmente extraordinário. Christopher Boone, adolescente de 15 anos, é portador da Síndrome de Ásperger e conta em seu livro o estranho caso do cachorro da vizinha que é morto a golpes de forcado. Após ser acusado pelo assassinato, o menino resolve buscar o verdadeiro culpado, iniciando uma série de descobertas sobre sua própria vida e sua família.

A narração se torna mais interessante por se tratar de um rapaz com comportamentos e habilidades peculiares aos portadores de Ásperger. Ele tem dificuldades de se relacionar com pessoas, adora animais, implica com a cor amarela, mas idolatra o vermelho, entende muito sobre as constelações, é extremamente inteligente, capaz de resolver problemas matemáticos com facilidade, tem comportamento solitário, não suporta que alguém lhe toque e não entende linguagens figuradas. Um personagem rico, cheio de nuances e que amadurece conforme o desenrolar do drama.

Sua mãe lhe abandona por não conseguir conviver e lidar com seu comportamento. Seu pai faz o papel do protetor, abnega-se de sua vida para cuidar e zelar pela vida do filho. Mas essa proteção excessiva leva a mentiras e mentir é algo que Christopher não admite. Em uma reviravolta da história, seu pai passa ser uma ameaça e sua mãe a salvação. De um ponto ao outro, o menino encara conflitos e revelações ao seu modo. Mas no final, todos os percalços valem a pena e ele se descobre um vencedor: “e eu escrevi um livro. Isso significa que eu posso fazer qualquer coisa, você não acha? Isso significa que eu posso fazer qualquer coisa” (fala de Christopher).
O potencial de um portador do autismo é imensurável e, infelizmente, ainda desconhecido. O próprio Hans Asperger, que apresentava dificuldade de se relacionar e era extremamente inteligente, se tornou um médico reconhecido e em seu artigo publicado em 1944 definiu a síndrome que leva seu nome. Eu tive a oportunidade de realizar um trabalho acadêmico em que me aprofundei no assunto e conheci uma escola especializada no ensino de crianças portadores da síndrome. Respeitar o universo deles é o primeiro passo para conhecê-los e certamente o passo seguinte é buscar identificar esse potencial presente em cada um deles. São pessoas realmente extraordinárias, capacitadas, sensíveis e que nos ensinam enxergar o mundo com “olhos apurados”. Hans Ásperger já chamava seus pacientes de “pequenos professores”, não à toa.

Quem vive esse personagem é o talentoso ator Rafael Canedo. Com 26 anos, ele interpreta o adolescente de forma tão convincente, que até nos aplausos é difícil saber se ele já deixou o personagem. Sem ser caricato, mas bastante realista, ele traz na voz inexpressiva, nos gestos repetitivos e até no olhar fugaz o jeito peculiar de Christopher.

A adaptação do livro para o teatro foi feita por Simon Stephens, e a montagem inglesa venceu sete de oito indicações aos Olivier Awards 2013. A montagem brasileira ficou por conta do diretor Moacyr Góes, que mergulhou fundo no projeto. Participam do elenco também Silvia Buarque (mãe de Chistopher), Thelmo Fernandes (pai), Sabrina Korgut (professora de Chistopher), Leon Góes, Carla Guidacci, Eduardo Rieche, Paulo Trajano, Ricardo Gonçalves e Fabiana Tolentino.

A peça estreou ontem, dia 10/4, e ficará em cartaz até junho no teatro do Leblon.

Veja aqui entrevista com diretor e alguns atores da peça.

Obs. A frase citada no início do texto é de uma das muitas mães que foram entrevistadas pelo diretor da peça e foi retirada do programa.

7 de abril de 2014

Entre nós - o filme



Divulgação

Quando assisti ao trailer, criei uma expectativa de um filme profundo, algo que levasse à reflexão sobre relação humana, os desejos de cada um, o que a vida lhes reservou com passar dos anos. Mas o filme é outra história e decepciona um pouco.


O argumento do roteiro é muito bom: reunir seis amigos para ler suas cartas, enterradas propositalmente dez anos antes durante uma viagem. Jovens cheios de sonhos, libidos e desejos se reuniram na década de 90 em uma casa no alto da serra. Lá, resolveram escrever cada um sua carta com uma mensagem para dez anos depois. E o que mudaria na vida de cada um? Como eles se relacionariam depois daquele encontro? O que cada um se tornou?


De volta à velha casa, eles se reencontram depois de um bom período distantes, sem saber o rumo que vida alheia tomou. Uns se casaram, outros tiveram filho, dois ficaram solteiros, cada um seguiu sua carreira, bem sucedida ou não. Mas todos tinham ali um elo: um amigo que já não estava mais entre eles após um trágico acidente.  As lembranças desse amigo vieram à tona, mexendo com alguns segredos guardados há muito tempo.


O filme não conclui muita coisa, deixa entender que a vida segue, mesmo diante de algumas revelações, decepções, relacionamentos interrompidos. Cada um se despede sem promessas de um reencontro, como aquele momento fosse único, sem continuação.


Valem as atuações de todo elenco – Caio Blat, Carolina Dieckmann, Maria Ribeiro, Paulo Vilhena, Júlio Andrade, Martha Nowill e Lee Taylor –, assim como algumas (poucas) cenas engraçadas. Seria um ótimo filme, se soubesse explorar as relações e os sentimentos de cada personagem. Suas frustrações, suas conquistas e até como esses se tornaram adultos. Mas valeu a intenção. Roteiro e direção de Paulo Morelli.