27 de março de 2010

Entrelaçados (conto)

Parte I
Parte II
Parte III

A falta de oxigênio no cérebro ocasionou uma série de complicações no quadro de saúde do rapaz. Seu estado era grave e inspirava cuidados especiais. Logo, os médicos decidiram induzi-lo ao coma, para melhor controlar a situação.

Nessa hora, toda a família já se esbarrava pelos corredores apertados do hospital público. O encontro foi inevitável naquela data especial. Era aniversário do caçula e, depois de alguns meses afastados, os dois se encaravam, cada um com sua angústia e tristeza, a espera de uma resposta positiva dos médicos.

“Precisamos confiar em Deus. Só ele pode salvar nosso filho”, mentalizava a mãe. “Deus quis que o destino nos unisse nesse momento, em prol de nossa família”, refletiu o pai.

Sem trocar uma única palavra, eles ainda se entreolhavam, com olhos de peixe morto, com a dor de uma iminente perda do filho querido. O sofrimento era tão grande que qualquer sentimento de ódio e rancor era deixado de lado naquele momento. Não havia espaço para lamentos conjugais. Os outros dois filhos, irmãos do rapaz, também estavam presentes e a mesma distância que separava pai e mãe era percebida entre pai e filhos.


Já anoitecia, quando o médico veio trazer o boletim: “pai e mãe, precisamos conversar, me acompanhem, por favor”. Então, os dois seguiram o médico, cabisbaixos e sem expressar qualquer reação diante do outro, apenas aguardavam com apreensão os dizeres do médico.


“Infelizmente, seu filho sofreu uma paralisia cerebral devido à falta de oxigênio no cérebro, pelo longo tempo que permaneceu embaixo d´água. No momento, não podemos definir agora quais as possíveis sequelas desse acidente, mas já podemos alertar aos senhores que o caso é grave e exige cuidados especiais. Por isso, peço a compreensão dos senhores para entender como deverão proceder a partir de hoje...”

No discurso, o médico enfatizou a importância do cuidado e do amparo dos pais para a recuperação do filho. O amor dos dois certamente seria o melhor remédio e somente juntos poderiam reunir forças para suportar tamanha aprovação.

Naquela praia, naquele dia, naquela onda, ele não imaginava como sua vida iria se transformar. Talvez o acidente tivesse sido apenas um elo para reaproximar novamente os pedaços daquela família. Talvez eles não tivessem preparados para voltar a conviver juntos outra vez. Mas certamente, pais e filhos estavam dispostos a rever seus julgamentos e suas dívidas. Os que erraram, tiveram a oportunidade de progredir, os que sofreram, tiveram a chance de perdoar.

Mas era preciso acontecer uma fatalidade para apaziguar os corações? Será que apenas o sofrimento é capaz de ensinar o verdadeiro valor da vida? O tal rapaz de alguma forma conseguiu se recuperar e está escrevendo seu testemunho em um livro. Quem sabe ele consegue responder a essas perguntas até o final de seus registros?

Um comentário:

Ju disse...

De uma coisa eu tenho certeza nessa vida: nada é por acaso.