14 de agosto de 2015

Criadores de heróis



Não sou especialista em teorias da comunicação, mas não precisa ser um profundo conhecedor de teorias para pensar sobre o papel das grandes mídias na sociedade. A questão é: até que ponto aquilo que a comunicação de massa define como importante realmente influencia a opinião pública? Quem constrói os heróis nacionais?

A questão já foi exaustivamente debatida, uns com olhares negativos, outros positivos. Muitos, hoje, acreditam que, com avanço das tecnologias e a influência das mídias sociais, não há espaço para grande mídia determinar o que é relevante, enquanto o público apenas consome, sem reagir. Todo mundo informa, todo mundo recebe, todo mundo responde. Todos para todos.

Entretanto, muitos devem ter se perguntado: por que a mídia deu tanta divulgação, com extensa cobertura sobre a morte do cantor sertanejo Cristiano Araújo? Para muitos, ele passou ser conhecido apenas após sua morte. Isso gerou até polêmica sobre a crônica de Zeca Camargo chamando atenção sobre a comoção nacional diante do fato. Ele termina a crônica contradizendo a letra de Tina Turner “We don´t need another hero”. Mas quem cria nossos heróis?

Duas lembranças fortes que tenho da minha infância foram as mortes de Ayrton Senna e dos integrantes do grupo Mamonas Assassinas. Lembro da repercussão midiática de ambas as tragédias. Foi realmente uma comoção nacional. Eu, ainda criança, chorei como se o piloto fosse um ente próximo, familiar. A mídia me proporcionou isso. Ela permitiu que eu e milhares de brasileiros nos tornássemos próximos ao ídolo, ao herói Ayrton Senna. Até quem não acompanhava as corridas de Fórmula 1, nas manhãs de domingo, nem era fã do piloto se comoveu com a morte estúpida dele. Nunca antes daquele momento midiático se escutou tanto a música “Canção da América” de Milton Nascimento, quando a letra dizia “Amigo é coisa para se guardar do lado esquerdo do peito”. É como se milhares de brasileiros estivessem se despedindo de um amigo de fato.

Não menosprezando a morte de ninguém, muito menos dos sentimentos daquelas pessoas próximas aos que morreram, mas por que a mídia, de forma geral, adota esse tipo de ação? Apenas por audiência?
Muitos irão defender a ideia que independe da ação da mídia para alguém escolher seu ídolo. Afinal, somos livres para gostar de alguém que se destaca pelos seus atos, por sua profissão, por sua trajetória etc. Portanto, quando esse ídolo morre, é natural que seus fãs se manifestem, lamentem por isso. E a mídia estaria apenas repercutindo essa reação do público.

Uma das personalidades mais respeitadas e admiradas pelos brasileiros, independente de crença ou religião, já anunciava que sua partida seria feita em meio a uma grande festa nacional, o que “abafaria” sua morte. Pois bem, Chico Xavier desencarnou no mesmo dia em que o Brasil foi campeão da Copa do Mundo, em 30 de junho de 2002.

Enquanto o mundo e, principalmente, os brasileiros estavam todos voltados para a comemoração do pentacampeonato da seleção brasileira de futebol, pouco se falou da morte do famoso médium, restando pequenas notas nos principais veículos de comunicação. Será que ele não merecia verdadeira comoção nacional? Será que os brasileiros não sentiram a morte daquele também considerado herói? Será que ele chegou a ser um herói?

Um comentário:

Flávia Jorlane disse...

Da repercussão de Ayrton Senna nasceu Adriane Galisteu, e da banda restou a lembrança e os jargões usados hoje em memes. Cristiano Araujo era da Som Livre e amigo dos AMIGOS (quem lembra?) e serviu de distração para competir com as notícias da operação lava-jato. Depois só as "pequenas" emissoras se interessaram por cobrir a notícia e entrevistar os pais da namorada que também se foi. A Globo consegue, sem o apelo escancarado das demais emissoras, dar um toque de nobreza, fazendo a população absorver a história de seu Zezinho do Campo como se fosse a de Gandhi. Pena que não teve essa sensibilidade com Chico Xavier...