11 de abril de 2014

“O estranho caso do cachorro morto” – a peça

Divulgação
Como lidar com o autismo? O que passa na cabeça de um menino portador da síndrome? Quais os obstáculos de que ele e sua família enfrentam na sociedade? “Enquanto os outros educavam seus filhos para o mundo, eu tenho que educar o mundo para meu filho”, diz uma mãe de um menino autista.

Baseado em um livro de Mark Haddon, a peça narra uma história extraordinária na visão de um garoto não especial, mas igualmente extraordinário. Christopher Boone, adolescente de 15 anos, é portador da Síndrome de Ásperger e conta em seu livro o estranho caso do cachorro da vizinha que é morto a golpes de forcado. Após ser acusado pelo assassinato, o menino resolve buscar o verdadeiro culpado, iniciando uma série de descobertas sobre sua própria vida e sua família.

A narração se torna mais interessante por se tratar de um rapaz com comportamentos e habilidades peculiares aos portadores de Ásperger. Ele tem dificuldades de se relacionar com pessoas, adora animais, implica com a cor amarela, mas idolatra o vermelho, entende muito sobre as constelações, é extremamente inteligente, capaz de resolver problemas matemáticos com facilidade, tem comportamento solitário, não suporta que alguém lhe toque e não entende linguagens figuradas. Um personagem rico, cheio de nuances e que amadurece conforme o desenrolar do drama.

Sua mãe lhe abandona por não conseguir conviver e lidar com seu comportamento. Seu pai faz o papel do protetor, abnega-se de sua vida para cuidar e zelar pela vida do filho. Mas essa proteção excessiva leva a mentiras e mentir é algo que Christopher não admite. Em uma reviravolta da história, seu pai passa ser uma ameaça e sua mãe a salvação. De um ponto ao outro, o menino encara conflitos e revelações ao seu modo. Mas no final, todos os percalços valem a pena e ele se descobre um vencedor: “e eu escrevi um livro. Isso significa que eu posso fazer qualquer coisa, você não acha? Isso significa que eu posso fazer qualquer coisa” (fala de Christopher).
O potencial de um portador do autismo é imensurável e, infelizmente, ainda desconhecido. O próprio Hans Asperger, que apresentava dificuldade de se relacionar e era extremamente inteligente, se tornou um médico reconhecido e em seu artigo publicado em 1944 definiu a síndrome que leva seu nome. Eu tive a oportunidade de realizar um trabalho acadêmico em que me aprofundei no assunto e conheci uma escola especializada no ensino de crianças portadores da síndrome. Respeitar o universo deles é o primeiro passo para conhecê-los e certamente o passo seguinte é buscar identificar esse potencial presente em cada um deles. São pessoas realmente extraordinárias, capacitadas, sensíveis e que nos ensinam enxergar o mundo com “olhos apurados”. Hans Ásperger já chamava seus pacientes de “pequenos professores”, não à toa.

Quem vive esse personagem é o talentoso ator Rafael Canedo. Com 26 anos, ele interpreta o adolescente de forma tão convincente, que até nos aplausos é difícil saber se ele já deixou o personagem. Sem ser caricato, mas bastante realista, ele traz na voz inexpressiva, nos gestos repetitivos e até no olhar fugaz o jeito peculiar de Christopher.

A adaptação do livro para o teatro foi feita por Simon Stephens, e a montagem inglesa venceu sete de oito indicações aos Olivier Awards 2013. A montagem brasileira ficou por conta do diretor Moacyr Góes, que mergulhou fundo no projeto. Participam do elenco também Silvia Buarque (mãe de Chistopher), Thelmo Fernandes (pai), Sabrina Korgut (professora de Chistopher), Leon Góes, Carla Guidacci, Eduardo Rieche, Paulo Trajano, Ricardo Gonçalves e Fabiana Tolentino.

A peça estreou ontem, dia 10/4, e ficará em cartaz até junho no teatro do Leblon.

Veja aqui entrevista com diretor e alguns atores da peça.

Obs. A frase citada no início do texto é de uma das muitas mães que foram entrevistadas pelo diretor da peça e foi retirada do programa.

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